O que você vai ler nesse artigo

Muitas vezes nem pensamos que viajar sozinha é algo para solteiras, afinal, uma mulher casada tem companhia, certo? Vem aqui ler esse relato da Edra sobre o submundo da mulher casada que viaja sozinha. Reflexões, autoconhecimento, aprendizados e mais!

Por Edra Stoque

Colocar pessoas em caixas e divisórias, como quem organiza um armário, é uma prática comum hoje em dia e confesso que me incomoda bastante. Porém, se o mundo das mulheres que viajam sozinhas ainda é (um compartimento) pouco explorado, imaginem o submundo das mulheres-casadas-que-viajam-sozinhas.

Eu me lembro de ver amigas fazendo intercâmbio enquanto estávamos na faculdade ou antes de entrar para o mercado de trabalho. Conforme eu ia concluindo essas etapas sem fazer nenhuma viagem internacional sozinha, fui automaticamente “entendendo” que minha hora tinha passado e aquilo não deveria ser para mim.

Sempre me auto justificava como não tendo dinheiro suficiente, nem empenho para correr atrás. Acredito que dentro da minha cabeça nessa época o fato de fazer um intercâmbio estava necessariamente atrelado ao fato de estar solteira.

Em 2014, logo no último ano de faculdade encontrei um companheiro de vida e sonhos, e três anos depois nos casamos.

Exploramos vários destinos e estados brasileiros, e fiz minha primeira viagem internacional. Realizamos muitos sonhos, e alguns deles eu poderia dizer que uma década antes eu não teria nem ousado em sonhar.

Viajar é o nosso combustível, cada vez mais nos tornamos especialistas em sair por aí desbravando. A cada nova experiência nossa mente se abre para novas ideias e parecemos estar sempre alinhados nos mesmos propósitos.

Mudando a rota

Então, foi assim que no final do ano de 2019 ele recebeu uma proposta da empresa que trabalha para ocupar uma vaga na Cidade do México, sem data de retorno. Após conversarmos, tomamos a decisão e aceitamos mudar para um país que estava totalmente fora da nossa rota mental.

Essa sintonia que temos nos levou para o que eu chamo de próximo nível de vida, já morando no México. Nós dois consumimos bastante conteúdo de viagens e um belo dia estávamos conversando sobre uma mulher que estava fazendo uma viagem sozinha e que era casada. Parece que foi um clique simultâneo nos dois.

“Que coisa né, ela é casada, nem imaginava”, “Verdade, por que automaticamente pensamos que ela era solteira? ”

Não tinha nenhum indício de ser ou não ser, mas, no nosso subconsciente, se ela estava fazendo uma viagem longa daquelas sozinha, é porque ‘seguramente’ era solteira. Daí em diante meu sistema nervoso começou a enlouquecer de tantas sinapses conectando informações.

Viajar sozinha, mesmo casada

Já estávamos conversando com a ideia de fazer voluntariado num futuro, num estilo de viagem mais calmo. Com o intuito de aprender de forma aprofundada sobre assuntos relacionados a terra e permacultura.

Eis que surgiu a ideia: por que esperar se posso unir duas coisas ao mesmo tempo nesse momento? Posso fazer um voluntariado no México e com isso me aprofundar na língua e na cultura enquanto ganho conhecimento em uma área nova que tenho grande interesse.

Confesso que o que me motivou a fazer essa primeira viagem de duas semanas totalmente sozinha foram interesses próprios.

De repente percebi que queria saber como era o friozinho na barriga de estar sozinha, comprar uma passagem de ônibus, descer num lugar novo. Encontrar uma pessoa totalmente desconhecida, ter que interagir com ela, trabalhar, entender, conversar.

Como se tudo isso já não fosse novo o suficiente para fazer sozinha, ainda era em espanhol, e nessa época eu tinha bastante dificuldade e limitações. Mas eu realmente queria ter essa sensação que eu tanto via as pessoas falarem, pois com as inúmeras viagens que tive eu sempre fui com o apoio emocional do meu companheiro.

Se algo desse errado naquelas viagens, estaríamos juntos para sofrer as consequências e encontrar uma saída. Eu queria ver como era sair sem esse conforto. E para a surpresa de amigos e familiares, eu tive o TOTAL apoio e incentivo dele.

O que aprendi

Arrisco dizer que ele já via essa necessidade que eu estava sentindo de fazer algo assim antes mesmo que eu tivesse traduzido e verbalizados esse sentimento tão novo e “diferente”.

E arrisco dizer também que a surpresa de tantas pessoas indica o porquê de existirem tantos relacionamentos infelizes e amargurados. O fato de estarmos casadas não deveria excluir a possibilidade de fazermos algo incrível sozinhas.

Acredito que num relacionamento a dois, se um deseja fortemente realizar algo e não tem o apoio do outro o prejuízo é fácil de ser calculado: ou o relacionamento vai continuar e aquele que desejava algo ficará sufocado, anulando a si mesmo para se encaixar ao outro; ou o relacionamento não vai durar muito tempo.

Eu fiz esse voluntariado de duas semanas sozinha e totalmente mergulhada numa experiência social, cultural e gastronômica.

Melhorei significativamente o meu espanhol, conheci mais da culinária mexicana, escalei pela primeira, ajudei na produção e cultivo de cogumelos, almocei com locais, carpinei um lote, trabalhei com biocompostagem, conheci o banheiro seco, alimentei galinhas e limpei galinheiro, fiz trilha, tomei chuva e passei frio.

Aprendi muito mais do que seria possível descrever com palavras e achei que isso tinha sido o máximo da minha experiência, já estava mais do que satisfeita com o resultado. Mas a verdade é que às vezes a vida tem uma surpresa ainda maior do que aquela que você consegue prever ou mensurar.

Quando voltei pra casa

De volta à vida normal em casa, desde o primeiro segundo e a cada conversa eu fui reconhecendo o quanto aquilo tinha impactado em mim, na minha autoconfiança e autoadmiração, o quanto eu estava radiante e satisfeita comigo mesma.

Fui reconhecendo o quanto aquilo tinha verdadeiramente me feito realizada e feliz. E o quanto a minha felicidade refletia no nosso relacionamento. A minha felicidade realmente também era a felicidade do meu companheiro, e eu via isso pelo olhar de interesse que ele demonstrava em cada detalhe bobo que eu compartilhava.

Os amigos que encontraram com ele no período em que eu estive viajando me contaram posteriormente do orgulho com que ele falava de mim nessas semanas.

Eu fui por mim, mas viajar sozinha me mostrou o quanto é importante e especial estar acompanhada de alguém que verdadeiramente está olhando para a mesma direção que você. Alguém que quer te ver bem, mesmo que para isso tenha que ficar afastado por algumas semanas. E que está tranquilo por saber que é recíproco.

A admiração que eu sempre tive por ele, e achava que já era enorme, ganhou proporções novas, e vice-versa. Buscar o que havia de melhor em mim deu um novo significado ao nosso relacionamento, e isso não foi planejado. Mas sempre ouvi dizer que as coisas não planejadas tendem a ser melhores!

Dica de Mineral del Chico, no México

Nessa cidade tem uma das entradas do Parque Nacional El Chico, que abrange os pueblos de Estanzuela e Mineral del Chico. Além de inúmeras trilhas, também é uma área conhecida pela prática de escaladas em rocha, desde níveis iniciantes até avançados. Mineral del Chico é um pueblo mágico e é o destino mais comum entre os visitantes, que vão sempre em busca de atividades ligadas à natureza.


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