Pegar carona é uma aventura a parte, nos conecta com pessoas incríveis que sempre nos ensinam algo, como nesse relato de uma conversa de carona. Nesse relato da Mafê ela compartilha com a gente uma história de quando ela estava viajando sozinha por Portugal!
Sagres, Portugal | Por Maria Fernanda Romero
A minha primeira carona foi em Caxambu, Minas Gerais. Eu estava visitando uma amiga, que me jurou que na cidade dela era comum pegar carona. Então, pegamos e eu nem calculei os riscos. Alguns anos depois eu estava em Portugal, e o transporte público do país é meio ruim. Principalmente entre uma praia e outra. Aceitei que se eu quisesse conhecer mais lugares, precisaria enfrentar os medos e pegar caronas.
Era a primeira manhã de verão e eu tinha acampado em Sagres, o ponto mais sudoeste da Europa. Além do vento surreal, o sol estava encoberto por algumas nuvens. Apesar de já ser verão o tempo estava um pouco estranho. Caminhei até o Farol do Cabo de São Vicente e fiquei admirando a imensidão.
Decidi que era a hora de voltar para casa. Estava pensando em um bom ponto para pegar carona quando vi estacionada uma van incrível, daquelas que eu penso: “quando eu crescer, quero uma casa assim.” Cheguei na janela do passageiro com um sorrisão na cara:
– Oi, para onde você tá indo? – perguntei
O francês abriu um mapa das estradas de Portugal e Espanha e apontou um ponto que talvez nem fosse uma cidade. Eu que não tenho tantas habilidades em interpretar mapas torci e cabeça e imaginei que ele estava indo na direção oposta. Mas eu queria tanto andar naquela van que nem importava para onde ele ia.
– Será que você pode me deixar na Vila do Bispo? – Era um ponto fácil para voltar para casa e no caminho dele.
O francês de poucas palavras não me respondeu, desceu da van, deu a volta e abriu a porta do passageiro. No momento um pastor alemão veio em minha direção latindo. O segurança da casa talvez não estivesse acostumado com visitas.
– Ela late mas é mansa! Ela é um bebê na verdade, pode entrar. – sorri sem graça e subi na van. A bebê-segurança estava amarrada na parte de trás e não parecia tão mansa assim.
– Então, tudo bem mesmo você me deixar na Vila do Bispo? – perguntei novamente
– Na verdade eu não sei onde é a Vila do Bispo, eu tô indo pra lá – e apontou de novo algum lugar desconhecido por mim no mapa – Se a Vila do Bispo for no caminho, você me avisa e eu paro.
– Ok! – E se não for… pensei, eu peço para parar quando eu ver uma placa.
A carona
A van dele era antiga, o rádio era improvisado. As roupas abarrotadas com a cozinha. Não era aqueles motorhomes modernos da moda, tudo impecável. Era uma verdadeira casa sob rodas. Raiz. Perguntei para ele sobre a viagem dele:
– Eu vim até Portugal da França e agora quero voltar para Espanha e ficar um tempo lá.
Uma resposta simples. E ele não puxava muito assunto. Acho que era a primeira vez que eu pegava uma carona na qual eu estava mais curiosa sobre a pessoa do que a pessoa sobre mim. Queria fazer a pergunta que todos me fazem (e me incomoda muito), mas ao mesmo tempo,você quer saber como tornar essa vida viável.
– E o trabalho?
– Ahhhhhh – o francês também se incomodou com a pergunta. – Ahhhh, eu odeio o trabalho. O trabalho? Eu fiquei toda minha vida trabalhando. E pra que? Trabalho, muito trabalho. Então eu percebi que ia morrer, vendi minha casa, comprei a van e a cachorra. Agora eu tô aqui.
– E tenho certeza que está melhor! Eu adorei sua van.
– É um pouco velha…
– Mas está conservada!
Ele olhou para trás e deu de ombros. Acho que para ele não importava. Nem a van, nem o trabalho, nem o caminho. Talvez nem ele entenda o mapa que está carregando, mas agora o importante para ele era viver.
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