Imagina aquela cena de filme: viajar de carro sozinha num lugar paradisíaco. Mas fazer isso sozinha? Foi isso o que a Paula fez e compartilhou com a gente os medos, questionamentos, aventuras e reflexões dessa incrível viagem!
Por Paula Hopp
Em 2019 tirei 6 meses sabáticos e fiz uma viagem pela América do Sul. Nessa época eu estava morando na África do Sul há muitos anos e sentia que conhecia mais aquele continente que o meu. Já viajava sozinha há muito tempo, então nem pensei duas vezes e fiz a mala.
A aventura começou pela Argentina onde encontrei algumas amigas e fizemos muitos hikings pela Patagônia e fiquei realmente maravilhada.
Cruzei para o Chile e fiquei com gostinho de quero mais. Então, resolvi fazer a Carretera Austral, região do sul do Chile com muitas trilhas e lagos. Resolvi alugar uma daquelas vans que tem onde dormir atrás, tinha um cooler, um fogãozinho portátil e uma mesinha. E lá fui eu, de Puerto Montt dirigindo para o sul, com tudo que eu precisava dentro do carro, podia dormir onde quisesse, cozinhar, ler e abrir meu vinho.
Foi aí que o medo apareceu.
Dormir no carro sozinha
Na primeira noite parei meu carro num lugar na estrada era tranquilo, mas assim que parei vi que todo mundo conseguia me ver da estrada fiquei insegura. Pensei tudo bem é o primeiro dia vou procurar um camping! Cheguei no camping, abri uma porteira dirigi para dentro e não via ninguém só vacas!
Não deixe o medo tomar conta das suas experiências!
Logo pensei “estou no lugar errado…”. Até que vi um carro vindo na minha direção, perguntei pro moço sobre o camping e ele me disse que fora de temporada o camping fechava, mas que eu podia ficar lá se quisesse. Pensei “ótimo, eu, um rio, um pôr do sol maravilhoso e as vacas”.
Jantei, bebi uma taça de vinho e assim que me deitei pra dormir só conseguia pensar, estou sozinha no meio do nada e um homem é a única pessoa que sabe aonde estou e ele sabe que eu estou sozinha!
O desespero…. No fim dormi e acordei e tudo estava tranquilo, pensei “que besteira, né Paula!”
“Você está sozinha?”
No próximo dia começaram as aventuras em balsas! Essa região é cercada de água então existem balsas de algumas horas e outras de uma noite inteira, essas balsas são usadas por todos os tipos de carros e caminhões locais (até caminhões de gado!).
Entrei na balsa e todo mundo ficou me olhando, como se eu fosse um ET. Reparei que por não ser alta temporada realmente não tinha nenhum turista. Então, eu, mulher, sozinha, dirigindo uma van toda decorada chamava muita atenção. Assim, passei a noite com todo mundo me olhando e quem vinha falar comigo a primeira pergunta era sempre: “você está sozinha?”
Daí novamente aparece o medo, por que essa pergunta?
Por que todo mundo quer saber se eu estou sozinha?
Evitava responder. Se a pessoa me pressionava, cheguei até a mentir, dizia: “Meu amigo está descansando no carro!”
Sentia a necessidade de criar uma pessoa fictícia, e claro que a pessoa era um homem.
Depois de uns dias, cheguei num camping e não tinha mais ninguém, só eu. O dono do camping estava lá só de sunga para me receber. O lugar era no meio do nada completamente, sem sinal de celular do lado de um rio. Ele me mostrou o melhor lugar para estacionar realmente isolado só para mim.
Senti tanto medo de falar que estava sozinha que paguei o camping para 2 pessoas, dizendo que meu amigo estava descansando. Imagino que ele não acreditou, mas também não ia negar o dinheiro!
Nesse dia fiz uma fogueira e me sentei lá pensando nessa situação. Por que não conseguia assumir pra ninguém que estava sozinha? Por que sentia tanto medo? Já tinha viajado por tantos lugares, mas pela primeira vez estava isolada, em albergues ou outros camping sempre tinha mais pessoas, agora estava sozinha então senti medo.
A reflexão
Mas ao mesmo tempo reparei que apesar do meu medo tudo estava indo bem, ninguém tinha feito nada contra mim. Na verdade, todos tinham sido bem acolhedores. Será que tinha lido as entrelinhas das perguntas de forma erradas? Ou será que as pessoas só estavam curiosas? Será que só nunca tinha visto uma mulher sozinha viajar por aquelas bandas?
Decidi que ia mudar, que a partir daquele momento ia dizer a verdade. Ia contar a minha história como ela era. Ia mostrar pras pessoas que talvez nunca tivessem visto uma mulher dirigindo uma van sozinha, que nós existimos e que talvez a próxima mulher eles não estranhem tanto.
Decidi que ia pegar carona e ia dar carona na estrada (com cuidado claro, ainda somos mulheres na estrada e isso sempre tem um risco!). Eu decidi que talvez o medo não estivesse me permitindo viver as coisas completamente. Decidi que a maioria das pessoas são boas, e que eu quero conhecê-las sem medo e mais importante, quero que elas me conheçam de verdade!
Terminei meu vinho e tomei um banho de rio, finalmente livre.
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